segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Não sou eu quem está dizendo, é o Danto!

A idéia de se considerar o museu ou espaço expositivo uma extensão da sala de aula, um laboratório da criação artística, criando dentro desse ambiente sacralizado ateliers e salas de aula onde ações de aproximação entre crianças e jovens e a arte contemporânea são postas em prática, não é novidade. A percepção de que o museu deveria propiciar à comunidade um espaço de diálogo, para que a arte não fosse tão hermética e elitista, vem da metade do século XIX. Foi em 1852, no Victoria and Albert Museum, que se criou pela primeira vez a função de arte-educador, sob a influência de Ruskin e William Morris.

No Brasil este tipo de trabalho começou a ser desenvolvido a partir da década de 1950, em museus do Rio de Janeiro. Hoje já é comum encontrarmos instituições voltadas à arte contemporânea com programas educativos bem estruturados, como é o caso do Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, o Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, e o Centro de Arte Contemporânea Inhotim, em Brumadinho (Minas Gerais), só para citar alguns.

Mas apesar da longa história da arte-educação em espaços expositivos, ainda vemos resistência por parte de algumas instituições acadêmicas em se aproximar de tal prática e contribuir para sua melhora. Ao contrário, o que acontece é o distanciamento acompanhado de duras críticas a qualquer iniciativa. A impressão que se tem é de que o que se quer é deixar tudo como está, a arte elitizada, e o povão ignorante, acreditando que arte é Leonardo Da Vinci, que arte é pintura e que arte é o belo.

Porém, hoje estava lendo uma entrevista com o professor de filosofia e crítico de arte Arthur Danto, sobre a filosofia da arte, e me deparei com uma afirmação muito interessante feita por ele: "(...) O museu é um fórum, e grande parte da arte tem conotações políticas. Mas há ainda um longo caminho, que se relaciona à educação, para que finalmente consigamos convencer os cidadãos a aceitarem de bom grado que seu dinheiro seja aplicado no patrocínio a um tipo de arte que eles muitas vezes acham repugnante. (...)"

Não sou eu quem está dizendo, é o Danto. Apesar de ele não falar especificamente em arte-educação dentro de espaço expositivo, acredito que a afirmação é suficiente para entendermos que na sua visão a educação tem um papel determinante na democratização da arte. Ainda mais num país como o Brasil, de sistema educacional público tão frágil e falho, principalmente no que diz respeito à arte-educação.



Leia a entrevista na íntegra e tire suas próprias conclusões:
http://www.scielo.br/pdf/nec/n73/a09n73.pdf

Saiba mais sobre:
Ruskin - http://pt.wikipedia.org/wiki/John_Ruskin
William Morris - http://pt.wikipedia.org/wiki/William_Morris

Referências bibliográficas:
- BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da arte: Anos oitenta e novos tempos. 6. ed. – São Paulo: Perspectiva, 2005.
- PEVSNER, Nikolaus. Os pioneiros do desenho moderno: de William Morris a Walter Gropius. São Paulo: Martins Fontes, 1980.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Cientificamente comprovado: a arte faz bem.

Em recente pesquisa, cientistas italia-nos "descobriram" o que nós profes-sores de artes já sabemos desde o primeiro dia em que pisamos numa sala de aula: arte faz bem à saúde. Os estudos foram coordenados pelo psicólogo e antropólogo italiano Massimo Cicogna que diz que basta amar a arte e gostar de conviver com ela para se ter efeitos benéficos imediatos.

Bem, se só estar perto da arte e dela gostar já contribui para a qualidade de vida das pessoas, imagine os benefícios de se fazer arte. Porém a pesquisa do professor Cicogna, realizada em museus da itália, se refere muito ao "belo", ou à beleza na arte, como fica claro nas seguintes declarações: "Os benefícios sobre a personalidade em geral também são enormes. A visão do belo ajuda. Dá a força necessária para afrontar com otimismo os desafios da existência e relaxa a mente" e "Os casais que convivem com a paixão pelo belo têm uma cumplicidade erótica muito mais elevada que os outros". Será que o pesquisador conhece a arte contemporânea?

E se a arte for feia? Um trabalho da artista gaúcha Karin Lambrecht pode fazer bem a uma pessoa, mesmo sendo feito com sangue? E uma latinha de "merda de artista", do também italiano Piero Manzoni? O que estou querendo trazer à reflexão é se devemos, ainda hoje, falar em belo. Não se trata de um preconceito contra o belo, não depois de Arthur Danto assumir que o que o atrai nas "Brillo Box" de Warhol é a beleza. Temo que a repercussão de uma pesquisa como essa reforce o preconceito sobre a arte contemporânea, que muitas vezes nada tem de bela. Pelo menos não formalmente falando.

Ainda assim, quero, como professor de artes, exaltar o lado positivo desta pesquisa, que diz que "o contato constante com a arte aumenta a capacidade de atenção, o desempenho sexual e a segurança em si mesmo. Também melhora o estilo de vida de qualquer pessoa". E quero complementar o que a pesquisa constata, trazendo minha experiência de dez anos de sala de aula, dizendo que fazer arte é extremamente benéfico para qualquer pessoa, de qualquer idade.

Recentemente tive um aluno que queria relaxar após o trabalho, mas não encontrava nada que o satisfizesse. Ele então me procurou e disse que queria aprender a desenhar. Ele estava com 46 anos, se não me engano. Em quatro meses de trabalho, com aula uma vez por semana, o desenho dele saiu do palitinho e foi à figura humana com luz e sombra, cenário com perspectiva, com ótima qualidade. Pessoas relaxam jogando futebol, outras relaxam desenhando.

E não pára por aí. Já vi crianças com dificuldades em matemática terem uma melhora significativa depois de experimentarem os origamis modulares. Dei aula de pintura numa clínica psiquiátrica e vi, diante dos meus olhos, os pacientes saírem das "trevas" à sociabilidade. E não estou falando em arte-terapia, estou falando em fazer arte, seja na aula de artes do colégio, seja num atelier, seja brincando em casa diante da TV, seja criando personagens para jogos como nos RPG's. O importante é ter outros meios de expressão que não só a fala, é não ter medo de errar, não ter vergonha do feio

Leia a matéria sobre essa pesquisa do professor Massimo Cicogna no endereço abaixo:

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Educação: o desafio do século XXI

É crescente a preocupação em torno das questões que envolvem o ensino da arte, não só no Brasil, mas em todo o mundo. Um exemplo disso é a recente união de três associações internacionais de educação pela arte (InSEA, IDEA e ISME) para a formação da Aliança Mundial para a Educação em Arte (WAAE - World Alliance for Arts Education), que tem por objetivo desenvolver uma estratégia integrada de pesquisa, colaboração interdisciplinar e ações junto a organizações governamentais e não-governamentais.

A fragmentação social, a violência urbana, o consumo e o tráfico de drogas, as diversas formas de discriminação, a poluição do meio ambiente, a dominante cultura global de competição e o desenvolvimento tecnológico acelerado, são algumas das preocupações em torno das quais giram as discussões sobre a educação neste início de século XXI.

As mudanças ocorridas na forma de pensar, fazer, apresentar, divulgar, distribuir e comercializar arte, nos últimos 150 anos, contribuem para aumentar o desafio na área do ensino da arte, ou da educação pela arte. Existem divergências na abordagem do assunto em diferentes níveis na esfera cultural atual e no sistema das artes global. As diversas realidades em diferentes continentes e países fazem com que seja necessário e imprescindível considerar os contextos em que cada manifestação artística ocorre.

A independência da arte, defendida por alguns, se torna cada vez mais difícil, visto que hoje a arte não está desconectada da economia, da política, da comunicação, da ciência e da tecnologia. Grandes corporações financiam mega exposições, grupos financeiros internacionais criam fundações e centros culturais, incentivos fiscais são dados para que a iniciativa privada invista em arte, enquanto artistas criam usando a mais alta tecnologia, ou, muitas vezes, em colaboração com laboratórios e cientistas, criando manifestações artísticas que contribuem para que o público em geral pergunte: e isso é arte?

É aí que entra a educação. As lacunas deixadas por um sistema educacional sucateado e pela formação cultural baseada na televisão são cada vez mais aparentes. Os próprios professores sentem-se perdidos, muitas vezes, diante de uma instalação, de um vídeo ou de uma performance. E essa situação é paradoxal, se pensarmos que o Brasil é um país que tem artistas contemporâneos extremamente reconhecidos no mundo todo, alinhados às pesquisas mais atuais em termos de linguagens, procedimentos, materiais e temas, e que movimentos importantes tiveram aqui alguns de seus grandes expoentes, como é o caso da Arte Conceitual e da Arte Concreta.

Essas questões têm sido, inclusive, tema de divergências entre a Academia e o mercado, discutindo-se se é necessário que hajam ações educativas. Se estivéssemos falando da Europa, seria mais simples a questão, pois em qualquer país europeu, onde as pessoas têm o hábito de freqüentar museus e lá estar diante de obras dos grandes mestres, boa parte do trabalho empreendido em ações educativas seria desnecessária.

Esse Blog se destina a discussões sobre esses e outros assuntos de interesse de todos, seja na área da educação, da arte, da cultura, do comportamento ou da vida em geral.